Zen: o que é e como se aprende – parte 2

caligrafia Nagare de Angelo Mokutan

Este método radical de ensinar a arte do roubo ilustra habilmente a metodologia do Zen. Quando um discípulo pede a um mestre que o ensine o Zen, o segundo pode dar um tapa na cara do primeiro e dizer: “Você é um preguiçoso!” Se um outro se aproxima do mestre e diz: “Tenho uma dúvida sobre a verdade que fala da liberação do laço das paixões”; ou alguma outra pergunta do tipo, o mestre pode dizer, em frente de todos o monges: “Vejam, monges, aqui temos alguém que cultiva uma dúvida!” O mestre pode empurrar o discípulo e retornar humildemente para os seus aposentos. Se perguntam para um mestre se ele entende o budismo, ele dirá: “Não compreendo”. Se questionado mais ainda: “Quem entende o budismo então?” E apontará para um pilar fora do seu quarto de estudos.

Os mestres da espada japonesa às vezes usam o método de treinamento Zen. Quando um discípulo que queria ser instruído na arte da espada encontrou um mestre, este, que estava em retiro no seu casebre na montanha, aceitou a tarefa. O discípulo teve que pegar água da fonte, cortar lenha, fazer fogo, cozinhar arroz, varrer os quartos e os jardins, e fazer trabalhos domésticos em geral para o mestre. Não havia nenhum ensinamento regular ou técnico sobre a arte. Depois de algum tempo o discípulo ficou insatisfeito, pois não havia vindo trabalhar como um servente, mas para aprender a arte da espada.

Teorização pode funcionar muito bem quando se joga futebol, se constrói fábricas, fortalezas, se produz bens industriais ou instrumentos mortíferos de várias espécies, mas não quando se cria objetos de arte, ou se quer dominar uma arte, o que são expressões diretas da alma humana.

Então um dia o discípulo se aproximou do mestre e pediu para que o ensinasse. O mestre concordou. O resultado foi que o jovem não conseguia fazer mais nada tranquilamente. Pois quando ele começava a cozer o arroz de manhã, o mestre aparecia por trás e golpeava-o com um bastão. Quando ele estava no meio de uma limpeza, varrendo, ele sentia o mesmo golpe, vindo de uma direção desconhecida. Ele não tinha paz, e tinha que viver em alerta. Passaram-se alguns anos até que ele conseguiu se desviar dos golpes que viessem de qualquer direção. Porém o mestre ainda não estava satisfeito com ele. Um dia o mestre estava cozinhando sua comida numa fogueira, fora de casa. O discípulo achou que era uma oportunidade e decidiu aproveitá-la. Pegou um grande bastão e foi golpear a cabeça do mestre, que estava inclinado em direção à panela para mexer o seu conteúdo. Porém o mestre parou o bastão do discípulo com a tampa da panela. Isso abriu a cabeça do discípulo para os segredos desconhecidos dessa arte. E pela primeira vez observou a gentileza sem igual do mestre.

Nisso há algo do método Zen de treinamento, que consiste em experienciar pessoalmente a verdade seja ela qual for, e não apelar à intelectualização ou à sistematização teórica. Esta se ocupa com o detalhe da técnica, é superficial e nunca leva ao fato central do problema. Teorização pode funcionar muito bem quando se joga futebol, se constrói fábricas, fortalezas, se produz bens industriais ou instrumentos mortíferos de várias espécies, mas não quando se cria objetos de arte, ou se quer dominar uma arte, o que são expressões diretas da alma humana, ou se quer viver uma vida autêntica. De fato, tudo o que tem a ver com criação genuína é realmente “intransmissível”, ou seja, está além da compreensão discursiva. Por isso o lema do Zen é “Não se apoiar em palavras”.

referência bibliografica:

SUZUKI, Daisetz. (対訳)禅と日本文化 Zen and Japanese Culture. Tokyo: Kodansha International, 2005.

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Até a próxima e fique Zen!

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